quinta-feira, 30 de junho de 2011
Tentando sobreviver na cidade
O que será que passa na cabeça de quem amarrou cordas no tronco desse eucalipto?
Certamente elas serviram para amarrar faixas de propaganda, leitura de búzios, mudança na mão da rua ou aviso de animal perdido, mas depois das faixas retiradas, sobraram.
Acontece que a árvore continua crescendo, seu tronco continua alargando e as cordas começam a enforcá-la. E isso pode acabar em morte!
Imagine colocar um cinto numa criança e forçá-la a continuar até a vida adulta com ele na cintura? Ou uma coleira justa no pescoço de um cachorro filhote e não alargá-la nunca mais?
Parece crueldade, não? Pois é...
Todo o sistema de transporte de água e nutrientes absorvidos do solo está localizado bem abaixo da casca das árvores. É por aí que essas substâncias são levadas até a copa para alimentar as folhas. Adivinha o que acontece se uma corda ou qualquer outro material promove a interrupção desse "encanamento"?
Outro exemplo de falta de respeito com árvores é a antiga mania de pintar troncos de branco. A justificativa de alguns é evitar formigas nas folhas, fazendo a pintura com cal; já outros cometem a agressão ao vegetal em nome da estética.
E a pergunta é: fica mesmo mais bonito assim?
A camada de tinta funciona como uma "plastificação" do tronco, impedindo a casca de se desenvolver normalmente e descamar quando necessário. É uma situação completamente artificial, que traz prejuízos à árvore além de intoxicar os seres vivos que nela se instalam.
Uma árvore em condições normais no meio ambiente pode abrigar, ao longo de toda sua vida, mais de 100.000 indivíduos de diversas espécies, como pássaros, besouros, abelhas, aranhas, joaninhas, formigas (sim, elas fazem parte da natureza!) e seres que nunca enxergamos e sequer imaginamos existir. Mesmo nas cidades elas funcionam como "ilhas de vida", abrigando biodiversidade.
Será que só porque foi plantada numa calçada precisa estar adequada à estética da cidade e, para isso, ser fantasiada de poste?
quinta-feira, 23 de junho de 2011
quarta-feira, 22 de junho de 2011
Cada um fazendo a sua parte
Fui atrás de quem jogou, querendo saber:
- Por que o spray de tinta não está no lixo reciclável?
- Latinha de spray não é reciclável, é?
- Você procurou alguma indicação na lata?
- Não, mas acho que não tem.
Esse é o tipo de situação que mostra que ainda falta um tanto para que todos se conscientizem e sem empenhem em encaminhar cada tipo de material para o seu destino correto.
A resposta "não, mas acho que não tem" é exemplo claro de que não sabe, não procurou descobrir e tomou qualquer decisão.
Por outro lado, é interessante aproveitar a situação para algumas análises:
- a latinha de tinta em spray não mostra o símbolo da reciclagem, aquele triângulo formado por três setas.
- a indicação "aço reciclável ecológico" está escrita de maneira discreta, sem chamar atenção para a palavra "reciclável".
- a informação é muito pequenininha, na lateral da embalagem.
Enquanto se trabalha para educar o consumidor a respeito de sua responsabilidade em destinar corretamente o lixo que produz, porque as empresas não aproveitam para informar mais claramente que já estão trabalhando com materias ecologicamente corretos?
Ao invés de simplesmente cumprir a lei e imprimir pequenininho na lateral ou no verso da embalagem as informações obrigatórias sobre sustentabilidade e reciclagem, por que não chamar a atenção do consumidor para essas questões e divulgá-las claramente, dando destaque e importância?
Tenho certeza de que seria um diferencial no mercado e serviria como critério de desempate na hora da compra, influenciando quem está em dúvida entre duas marcas.
quarta-feira, 8 de junho de 2011
As deliciosas histórias da Missão Cambuci
Se antes já me empenhava em trocar mudas, sementes e experiências por aí, agora então faço questão de retribuir toda a ajuda que me deram na coleta de frutos dessa espécie ainda em risco de extinção, nem que tenha que revirar caçambas de lixo em busca de meus frutos podres jogados ali sem querer ou confinar pequenas árvores dentro de uma caixa de camisa e mandá-las por correio em viagem de 10 dias rumo a Porto Seguro.
Foram três meses de e-mails, conversas, pesquisas e bastante estrada atrás de qualquer quantidade de sementes que se pudesse conseguir. De algumas cidades voltei com um único fruto na mão. De outras, vieram quilos e quilos de cambuci em todos os estados de conservação que se possa imaginar, do mais saboroso e perfumado ao mais podre e fedido. E para fazer valer cada e-mail enviado e cada litro de gasolina gasto na empreitada, todos os frutos foram cuidadosamente despolpados e tiveram suas sementes selecionadas, processo trabalhoso que levou dias e dias até ser finalizado.
A boa notícia é que o número é grande: são 4.773 sementes viáveis sendo regadas diariamente e recebendo cuidados dignos de estrela. E vale lembrar que apenas cerca de 25% das sementes de um cambuci são viáveis, ou seja, tem possibilidade de germinar, então calcule o quanto de sementes conseguimos!
Por isso, para mostrar que quando cada um faz um pouquinho o resultado é incrível, a seguir conto as histórias de quem topou abraçar comigo essa causa.
Coletas secretas
No começo, quando éramos só eu e eu nessa aventura, passei algumas semanas monitorando os três únicos pés de cambuci adultos que conheço na cidade.
Um deles, na rua, tem a copa muito alta e nas primeiras visitas que fiz não encontrei nenhum fruto no chão. Era preciso continuar monitorando até que amadurecessem mais um pouco e começassem a cair. Só que, depois de duas semanas quando voltei ao pé, não sei via mais um único cambuci em lugar nenhum, no chão ou na copa. Algum coletor de sementes mais rápido do que eu deu cabo de tudo. Primeira decepção.
Outra árvore, pequena ainda e na rua também, tinha só dois frutos quando a visitei pela primeira vez, mas estavam ainda muito duros e não tive coragem de arrancá-los antes da hora. O cambuci, assim como o abacate, tem a casca verde mesmo quando está maduro, então só se sabe se está bom para colher apalpando a fruta. Nesse dia também fui embora de mãos abanando e, quando voltei lá, não encontrei mais nenhum. Segunda decepção.
Restava a terceira árvore, dentro de um parque municipal onde dizem que não se pode coletar nada. Já sabendo que é uma árvore das boas e que no ano passado produziu bastante, resolvi não correr riscos e a cada visita levar comigo alguém que me desse cobertura. As instruções para os acompanhantes eram:
1) Enquanto encho meu saquinho secreto (camuflado dentro de uma bolsa grande) fique de olho e me avise se vier alguém do parque.
2) Faça sempre cara de paisagem. Tem tudo a ver com o lugar.
3) Se alguém vier reclamar e dizer que não se pode pegar frutos, finja que não me conhece e eu me viro sozinha. Melhor só uma metida nisso.
Deu tudo certo e saímos incólumes (e abastecidas!) de todas as investidas, então ficam aqui meus sinceros agradecimentos às amigas que corajosamente me acompanharam em nome da preservação da espécie: Helô, Bia e Mari L.
Um ecólogo alto astral
Escalado pela minha mãe para ajudar na Missão Cambuci, o Vitor, ecólogo e professor mais sabido e divertido que eu conheço na área, aproveitou o dia de aulas que deu em um parque para coletar frutos num pé que conhecia. Logo chegou um e-mail: Ju, pode vir buscar, tem um tanto aqui pra você.
Passaram mais uns dias e recebi outro e-mail: Ju, tenho mais.
Mas antes de conseguir encontrá-lo veio mais uma mensagem, desta vez triste: Ju, minha tia velhinha viu aquele monte de frutos podres e, achando que era lixo, jogou tudo fora. Semana que vem tento mais uma coleta.
Sem comentários sobre a tia velhinha.
Sorte que dentro de mais alguns dias veio outro e-mail: Ju, mais. Estão ao lado da minha mesa em cima de um vaso com o seu nome. São de uma variedade pequena mas bastante doce. Estão meio podres, já, e os colegas de trabalho reclamando que está fedido, mas é história deles; eu não sinto nada. E já avisei que é proibido jogar fora! Se eu não estiver aqui quando você chegar, pode entrar e levar.
Vitor, muito muito obrigada. Conte comigo para o que precisar, e assim que as mudas estiverem grandinhas me diga quantas quer e te entrego sem pestanejar.
A dupla dinâmica
Sair do sítio da Mari e da Carmem sem a certeza de ter conhecido o significado da expressão “calor humano” é impossível. Na chegada já tem festa como se fôssemos amigas há anos, com beijo, abraço, sorriso, boas vindas da cachorrada, gato trançando nas pernas, cafezinho, biscoito, um monte de histórias divertidas e o almoço pronto esperando. Isso porque a ideia era coletar o que elas tem no quintal, mas parecia que quem estava fazendo o favor era eu.
Depois de duas visitas, muitas risadas e andanças pra conhecer o sítio, ganhei geléia de cambuci feita por elas e sementes já prontas para plantar, além dos frutos propriamente ditos. E mais folhas de flor de cera para fazer mudas, bulbos de dália, de clívia, mudinhas de suculenta, sementes de anis estrelado, de rambutan e um caroço de abacate. Só esses 10 itens porque recusei outros 23 que Mari ofereceu, tentando convencê-la de que agora quem precisa de um sítio sou eu!!!
Mari e Carmem, como agradecer tanto carinho?
Muito obrigada por tudo e são de vocês todas as mudas de cambuci que nascerem, me digam quantas querem.
Rosana, Henrique e os ouriços
De Mogi das Cruzes, no início de abril, chegou o e-mail da Rosana: Tenho um pé de cambuci a pleno vapor, separei um tantão de frutos para vc. A árvore frutifica de 3 a 4 vezes por ano. Entre em contato.
Era pra já! Em dois ou três dias combinamos tudo e, sorrindo de orelha a orelha, parti para Mogi das Cruzes, escala de uma viagem a São José dos Campos para ajudar a babar, quero dizer, cuidar do sobrinho recém nascido.
Fui recebida com pão de queijo quentinho e suco de cambuci feito na hora. Não é demais? Batemos um papinho de uma hora e segui viagem, já mais de nove da noite, levando na bagagem cambucis maduros e cheirosos (ô fruta de cheiro bom!), cambucis podres para extrair sementes e ainda polpa de cambuci congelada, pra fazer suco e mousse.
De presente levei mudinhas de árvores de três espécies, mas mesmo assim fiquei até meio sem graça com o tanto de coisas que ganhei, a quantidade de pães de queijo que comi e todo o suco de cambuci que bebi! Minha mãe tinha me dado mais educação...
Cheguei a São José dos campos para uma estada de quatro ou cinco dias e escolhi um canto da varanda onde deixar o saco de cambucis podres até o dia de ir embora. O cheiro de vinagre é forte, não dá pra ficar com aquilo por perto. Mas sem me esquecer da tia do Vitor, avisei a todos da casa que ali estavam minhas preciosas sementes, não era pra mexer no saco.
Passados os meus dias de tia babona de primeira viagem, me ajeitei para tomar a estrada de volta e, na hora de ir embora, cadê os cambucis?
Juro que por alguns minutos dei uma de maluca e andei em círculos olhando em volta e repetindo “cadê eles?, cadê eles?, cadê eles?”. Eram 4, 5, 6 quilos de frutos e tinham sumido! Logo caiu a ficha que alguém que foi ajudar na faxina da casa naquele dia não sabia do que se tratava e jogou tudo no lixo.
Não, lixo de novo não!
Corri para o interfone e o porteiro me disse: tá tudo aqui ainda, o lixeiro só passa mais tarde.
Num passe de mágica lá estava eu, protagonizando espetáculo na calçada do prédio, abrindo caçamba por caçamba, saco de lixo por saco de lixo atrás dos cambucis da Rosana.
O porteiro parou do meu lado e disse: já sei, você jogou seu celular no lixo! A moça do 72 também fez isso outro dia. Às “veiz” bate uma bobeira e a gente faz essas coisas, é normal.
Eu dei risada e resolvi explicar que não era o celular, era pior! Era um fruto em risco de extinção e eu tinha arrumado sementes pra plantar. E então ele me surpreendeu: Extinção? É sério? Ah, mas então nós vamos ter que achar isso!
Nesse momento Tomé virou meu herói. Tem amigo meu que não diria uma frase dessas.
E foi um tal de conhecer a intimidade dos apartamentos vizinhos até que... Maktub! Dentro do enésimo saco preto que abri estava a sacolinha do supermercado Maktub de Mogi das Cruzes, onde a Rosana faz compras. Maktub, em árabe, que dizer “estava escrito”. E estava mesmo. Aqueles cambucis eram meus e ninguém tascava!
Depois dessa experiência inesquecível ainda voltei mais uma vez a Mogi, recentemente, porque como tinha dito a Rosana, a árvore do sítio frutifica de 3 a 4 vezes por ano e ela tinha mais frutos pra mim. Dessa vez cheguei e a encontrei, junto com Henrique, em volta de uma banheira infantil de plástico, na calçada, tomando sol. Dentro da banheira dois ouriços, animais da savana africana. São criaturas acostumadas ao calor, e como os dias do fim de maio vinham sendo cada vez mais frios, era preciso esquentá-los um pouquinho.
Não, isto não é um cambuci! É o ouriço do Henrique, filho da Rosana
De novo ganhei lanchinho e, desta vez, suco multi frutas preparado pelo Henrique além de um tanto maior ainda de cambucis podres. Nunca vi alguém ficar tão feliz com um sacão de frutas estragadas!
Rosana, não tenho palavras para explicar para quem não te conhece o quanto você é delicada e simpática. Muito obrigada pela acolhida sempre tão carinhosa, pelos quilos de cambucis bons, “ruins”, pelas polpas congeladas, pães de queijo, bolo de cenoura...
E vamos plantar por aí mais dessa espécie pela qual nós duas temos tanto carinho. Me diga quantas mudas quer e elas são suas.
Depois de tudo isso veio a hora de despolpar os frutos. Eu e Flop, dono do Viveiro Oiti, em Holambra - SP, passamos horas e horas sentados em frente a uma peneira e uma torneira com a mão na massa, uma massaroca úmida e com forte cheiro de vinagre, separando a casca e a polpa das sementes.
A etapa seguinte foi passar as sementes pela peneira, lavando com um jato forte de água para tirar os restos de polpa, que continua a apodrecer sob a terra e pode por a perder todo o processo de germinação.
Então as sementes limpinhas foram postas para secar à sombra sobre folhas de jornal e depois selecionadas uma a uma, trabalho que consiste em separar as vazias das “gordinhas”, as chamadas sementes viáveis.
Depois disso as escolhidas foram colocadas em tubetes sob fina camada de terra, serão regadas diariamente e devem demorar cerca de 60 dias para mostrar as primeiras carinhas. Isso deve acontecer no final de julho.
Agora, só no ano que vem. O cambuci floresce entre novembro e dezembro e seus frutos amadurecem de março a maio, quando aliás acontece o Festival do Cambuci, em Paranapiacaba – SP, e a Rota do Cambuci, em um circuito de cidades do interior paulista. Nessas festas é possível provar quitutes preparados com essa fruta tão simpática quanto desconhecida – muitos paulistanos acham que Cambuci é apenas o nome de um bairro.
A Rota do Cambuci ainda não visitei, mas em Paranapiacaba este ano tomei suco, comi bolo de chocolate com cambuci (é d e l i c i o s o!), mousse, trufa recheada e ainda comprei umas garrafas de pinga da fruta para dar de presente. Ano que vem vou fazer tudo igual outra vez!
Abaixo, a plantação de que tenho tanto orgulho. Ainda não se vê nada, claro, mas dentro de cada tubete está uma das sementes dessa história. E tudo sendo cuidado com carinho pelas mãos profissionais do Flop, a quem, junto com a mamma, falta agradecer por todo o empenho e apoio nessa empreitada. Muito obrigada!