segunda-feira, 27 de maio de 2013

Gincana de charretes em Holambra


Outro dia dei risada quando minha irmã me disse que depois que me mudei pra Holambra fiquei meio caipira. O comentário foi uma brincadeira (séria!), com a melhor das intenções, e claro que não me ofendeu nem um pouco. Muita coisa mudou sim, e hoje curto coisas muito diferentes das que curtia antes. Acho que não abandonei as de antes, mas aumentei o repertório de curtições com prazeres inusitados que só uma cidade brasileiro-holandesa do interior poderia me oferecer.

Aqui passei a viver situações das mais variadas, desde as simples e ingênuas como dar um bolo de presente e receber em troca um imenso cacho de bananas, até conversar numa rodinha de quatro pessoas onde cada um fala uma língua e todos dão risada tentando se fazer entender. Vim para o interior mas ao mesmo tempo conheci mais do mundo, e aqui participo de coisas que jamais pensei existirem. A gente está sempre meio suja de terra, andando de jipe ou caminhãozinho, mas vai comer no restaurante a quilo e escuta holandês na mesa de um lado, francês na do outro, inglês na do outro...  É gente do mundo inteiro que vem aqui negociar flores e às vezes até fica para morar. Certamente essa mistura de culturas encerrada numa cidade pequenininha é uma das coisas que faz de Holambra uma cidade muito especial.

Já vi fanfarra tocando samba em trajes típicos holandeses, acompanhei procissão a cavalo da festa da igreja, assisti a corais cantando em latim, encenação de presépio, e ontem, pela primeira vez, a gincana de charretes. Segundo contam os filhos e netos de imigrantes holandeses, as gincanas surgiram logo nos primeiros anos do estabelecimento da colônia por aqui (anos 40 e 50), para entreter e integrar as famílias, que viviam isoladas, sem entender nada de português e sem dinheiro para viajar. Era uma vida simples, rústica, cada família no seu sítio, com muitas crianças - ter 10 filhos era normal - e muito trabalho a fazer. Não existia televisão, quase ninguém tinha carro e as poucas atividades fora de casa eram a escola para os jovens e a igreja para toda a família.

Aí então os mais animados resolveram agitar e inventaram atividades e brincadeiras com o que havia disponível. Assim surgiram os primeiros corais, campeonatos de esportes, os espaços de lazer e as gincanas. Ainda não sei muito sobre as histórias de antigamente, mas o que vi ontem certamente é o que sobrou das brincadeiras rústicas do tempo da imigração, e continua com as características daquela época porque se for de outro jeito não tem a menor graça.

Todos os anos a moçada de vinte e poucos anos se junta para a gincana de charretes, e só mesmo tendo vinte e poucos pra topar as bagunças que eles inventam. É nessa hora que os netos dos imigrantes esquecem as frescuras da cidade grande - São Paulo, Campinas e adjacências - onde estão fazendo faculdade, e encaram água, lama e a poeira da roça.

O dia estava lindo, com aquele céu azul incrível de outono, e as equipes, em charretes e carroças enfeitados com flores e caixas de som, começaram a brincadeira às 7 da manhã. Eu fui de carro (que já passei dos vinte e poucos) parando de prova em prova, pra ver do que se tratava. Na prova do estilingue de ovo um participante puxa o super elástico preso em dois postes e o outro se protege, com uma telha e uma caixa de ovos, atrás de uma trave que emoldura uma telinha (que trata de filtrar as cascas para não machucar a vítima).



Depois as equipes têm que encher vasinhos com terra e flores e levá-los, sobre uma telha quebrada, até a outra ponta do circuito, pisando dentro de pneus sem derrubar nada. Derrubou, perde ponto. Demorou, perde também.



Em seguida, em homenagem aos holandeses, uma prova com batatas, a base da alimentação neerlandesa. A "história" pra justificar a prova era a seguinte: os holandeses chegaram no Brasil e só encontraram arroz e feijão para comer. Mas ficaram com saudades das batatas, e como aqui chovia muito tiveram que colher batatas na lama. Muito bem, então, usando tamancos, quem pegar mais batatas no menor tempo ganha. Um entra no lamaçal e o outro da equipe fica vendado na beirada, segurando um baldinho pra recolher a colheita. No fim, só de molecagem, quem está de fora empurra o vendado e vai todo mundo parar na lama. Das batatas ninguém nem lembra mais.




Toca entrar na charrete e partir para o próximo ponto, atravessando sítios e pomares nos arredores da cidade. Na prova seguinte a vez é do cavalo. Numa charrete da organização alguém da equipe tem que percorrer um trajeto puxando um cavalo de pelúcia e um certo peso em chumbo, de acordo com o peso físico de cada um.


Também vale levar umas crianças, pra pesar mais.


Mais uma andada de charrete e chega-se na prova do pomar, onde o objetivo é colher laranjas e, com o cavalo andando, arremessá-las na bandeja do boneco-garçom. Quanto mais latinhas derrubar, mais pontos.



Por fim vai todo mundo pro lago, remar num caiaque com a maior quantidade de tranqueira que conseguir embarcar. Um rema, o outro empurra nadando, e tem que ir e voltar rapidinho sem deixar nada pra trás.



Depois das provas a moçada volta (cada equipe na sua charrete) pro sítio-base da gincana e faz um churras, que ninguém é de ferro. Tem entrevista pro jornal da cidade, contagem de pontos e premiação, que eu nem sei o que era, mas isso certamente foi o menos divertido.

2 comentários:

  1. É assim mesmo: o mundo se resume, às vezes, num cantinho perdido numa cidade interiorana do Brasil. E descobrir coisas novas é possível em qualquer lugar. Por vezes, é até melhor nos cantinhos do mundo, onde se dispõe de mais tempo para a convivência e a troca. Que Deus a abençoe aí onde está. Dá para sentir que você está feliz. E isso é o que importa, de verdade. Deus a abençoe, garota! Beijo, Angela
    http://noticiasdacozinha.blogspot.com

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Muito obrigada, Angela!
      É sempre muito gostoso receber seu carinho via "comentários".
      Um abraço forte,
      Juliana.

      Excluir

Muito obrigada por comentar.
E se você não tem um blog nem um endereço no gmail, para enviar seu comentário basta clicar na opção "anônimo", logo abaixo da caixa de texto. Mas, por favor, assine seu nome.